Creio que era abril de 2003. Meu chefe havia me enviado pra Lapa pra entregar um catálogo. Naquela época eu era diagramadora num escritório pequeno a 10 minutos de distância da minha casa. Com 18 anos, era meu primeiro emprego de verdade, mesmo que não tivesse carteira assinada nem nada. Eu ganhava 200 reais por mês, e em 2003 isso era alguma coisa. Mas divago.
A data exata está anotada lá, mas não posso procurar agora. Mas era 2003. Eu estava voltando dessa missão dada pelo meu chefe e resolvi parar no centro de SP. Naquele dia eu comprei três coisas que dizem muito sobre mim: uma mochila, um livro e um cd. A mochila se desfez uns cinco anos depois, o livro eu troquei com um amigo, mas o cd continua comigo. Era o Substance, do Joy Division.
Um ano antes uma colega do colégio havia feito uma mixtape pra mim com várias músicas do que consideramos Anos 80. Tinha Depeche, tinha New Order, tinha Electronic, e tinha Joy Division. Ela tinha escolhido Transmission e Love Will Tear Us Apart pra que eu ouvisse. Como eu tava louca pra ouvir música boa, eu ouvi aquela fita até ela quase rasgar. É importante lembrar, aqui, que em 2002/2003 até existia computador, mas eu não era uma das contempladas com tal “privilégio”. Se vocês considerarem que quando eu voltava do trabalho e ia ouvir uma mixtape era numa máquina de escrever que eu despejava toda a minha mente, dá pra entender por que eu fiquei tão animada quando achei um cd usado na Galeria do Rock a R$ 18.
De qualquer forma, minha colega me mostrou essas duas músicas, mas foi meu melhor amigo que me jogou pra dentro do Joy Division. Ele gostava muito da banda, eu imagino que ainda deva gostar, e eu nem lembro mais como foi que ele me despertou o interesse. Só sei que daquela época em diante eu nunca mais ia parar de ouvir Joy Division.
Aquele cd que eu comprei na Galeria me ajudou a superar um coração partido, a sensação de solidão que me acompanhou ao longo de 2003, a raiva de não me encaixar onde quer que eu tentasse, a vontade de ir pro mundo e estar presa a um lugar no qual eu não queria estar, a frustração de ter que me virar sozinha… eu passei por bastante coisa ouvindo o Substance.
Daí, um ano ou dois depois, eu tive a oportunidade de conseguir as músicas pela internet da casa de uma amiga. Depois de muito procurar – again, metade dos anos 2000, as coisas ainda não eram tão fáceis de se conseguir – eu consegui o Unknown Pleasures e o Closer. Aí “desandou”.
Não tem um dia em que eu esteja confusa e perdida que eu não lembre da letra de Passover. Quando eu estou puta da vida com as coisas que acontecem aqui em casa, os versos de Isolation pulam na minha cabeça. Quando eu assisti Clube da Luta um pedaço de Heart and Soul me deu um chute na cara. Disorder fala comigo toda vez que eu percebo que a intensidade emocional que só o borderline pode proporcionar tá chegando. New Dawn Fades é perfeita pra dias como hoje, nos quais desistir de tudo é e não é ao mesmo tempo a única solução possível. Eu posso passar o resto do texto associando cada música do Joy Division com a minha vida, mas eu quero falar de uma em específico.
Something Must Break é, junto com Being Boring e Silent Lucidity, uma das músicas que funciona como uma parede. Quando ela aparece na minha frente, não importa qual é minha velocidade ou motivação: eu paro.
Ela tá no Still, um álbum póstumo que basicamente reúne o que não foi lançado nos dois “oficiais”. Ela é praticamente um grito. Ela, junto com Leaders of men, foi o que me fez querer aprender a tocar baixo. A bateria daquela música é simples, mas não é desse mundo. A guitarra parece que fala “sai de cima da sua bunda e vai fazer alguma coisa”. E a voz do Ian nessa música soa muito como quando ele está no palco, à beira de um ataque epilético, cantando Transmission, apesar de não ser gritada.
E é ela que eu estou ouvindo agora, e é ela que eu vou mostrar pra vocês agora.
Um dia eu traduzo a letra e aproveito pra contar a história do Joy Division. Agora não é hora. Agora é hora, pelo menos pra mim, de ouvir Joy Division enquanto dou conta da minha vida.
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Ah, sim. Já ia me esquecendo. Esse post foi feito hoje, 18 de maio, porque hoje é o aniversário de morte do Ian Curtis. Faz 36 anos que ele se enforcou na sala de casa ouvindo Iggy Pop, mas até hoje há quem se lembre dele. Tipo eu.
So… this is permanence. Don’t you think?
Então o Ian Curtis está eternizado em você. ^_^ Muito legal como você gravou essa experiência. Tem toda a emoção de gastar um salário, por menor que seja, nas coisas que gosta sem ser questionada, e se identificar com algo como nunca antes na vida. Foi um ótimo post. =)
ResponderExcluirTouching. Lembrei do aniversário da morte do Ian agora e tinha certeza que encontraria conteúdo por aqui (na verdade eu procurei no perfil do Fb e achei o link lá ehuaheua). Eu nunca lembro o dia, só que é alguns dias depois do meu aniversário e próximo ao dia 20.
ResponderExcluirSó não digo que esse post também me representa porque não sei tão bem as letras do JD (shame on me), mas eu certamente te entendo em tudo descrito aqui!